Texto escrito por Flávio Cardoso Arcângelis*
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Quando você pensa em SUS, qual a primeira lembrança que lhe vem à mente? Provavelmente você deve se lembrar do lado ruim do SUS: filas de espera, hospitais lotados e sucateados, falta de remédios, dificuldade para se realizar um exame e a demora no recebimento de seu resultado, além do tempo de espera para se conseguir uma consulta. De fato, todos esses são problemas que ainda não superamos, mas será que o SUS é apenas isso?
Pense um pouco. Quantas vezes você viu nos jornais televisivos reportagens que divulgavam o lado bom do SUS? Certamente divulgam-se muito mais as suas dificuldades do que suas virtudes. Há anos a mídia de massa vem o identificando com suas deficiências e o afastando de suas melhores qualidades. Só para citar um exemplo, a mídia passou dias cobrindo o drama vivido pela estudante Eloá – a garota que foi assassinada pelo ex-namorado em Santo André, São Paulo – e muitos foram os momentos em que ela poderia ter divulgado positivamente o SUS, mas em nenhum momento o fez. Enquanto ela apenas divulgava de modo sensacionalista a forma brutal como a garota foi morta, o SUS, através do ‘Sistema Nacional de Transplantes’, trabalhava para que cada órgão da menina fosse doado para salvar outras tantas vidas, mas isso nunca foi mostrado. Só no ano de 2007, foram realizados mais de 12 mil transplantes de órgãos pelo SUS – você sabia? Além desse programa, existem outros que são referências mundiais. É notório o reconhecimento mundial do ‘Programa Nacional DST e AIDS’ que concede assistência integral e totalmente gratuita a todos os portadores do HIV e doentes de AIDS. Isso tudo é SUS! É a prova de que ele já está dando certo.
Mas o SUS tem ainda grandes adversários que não querem que ele dê certo. São os mesmos inimigos do povo que controlam os meios de comunicação e mostram apenas as dificuldades do sistema. A mídia hegemônica – jornais e revistas de grande circulação, a televisão e o rádio – é a grande responsável pela criação dessa imagem negativa. Desde sua criação, ela serve aos interesses da classe dominante e, portanto, só produz pensamentos que perpetuam a manutenção do poder pela elite dominante. Esse massacre da desinformação promovido pela mídia elitista mantém na sociedade brasileira um momento de profundo desconhecimento de causas. Na área da saúde não poderia ser diferente.
O SUS foi concebido há cerca de 20 anos e desde então sofre fortes ataques da mídia burguesa exatamente porque ele pretende ser um sistema de saúde revolucionário. As bases desse sistema são fundamentadas em princípios éticos e de inclusão social que não interessa à elite brasileira. O princípio da universalidade garante o direito de que todos os cidadãos brasileiros possuam acesso aos serviços de saúde de modo gratuito, independentemente de qualquer tipo de contribuição previdenciária. Ele é o avesso do que quer a elite que está acostumada a sempre auferir grandes lucros da parcela mais pobre da população.
O processo histórico pelo qual foi concebido o SUS não deixa restar dúvida sobre o seu caráter transformador da saúde brasileira. Até a década de 1990 tínhamos um serviço de saúde que excluía a maior parte da população brasileira. Naquela época somente tinham acesso aos serviços de saúde aqueles que estivessem dentro da esfera trabalhista ou que pudessem pagar por serviços privados, ou seja, os trabalhadores com carteira assinada ou a parcela mais abastada da população. É a retomada dessa lógica de saúde privatista onde tudo se paga que é defendida pela grande mídia.
E isso não é difícil de perceber quando entendemos que ela é controlada pela mesma oligarquia que também controla toda a saúde privada. Observe as propagandas das TVs e dos grandes jornais, você perceberá que grande parte dos anúncios veiculados são da indústria de medicamentos, dos planos de saúde, das corporações médicas, da medicina de grupo, enfim, de toda a saúde que só funciona na lógica privada. E como “quem paga a banda escolhe a música”, os anunciantes que financiam os meios de comunicação também dão a linha política a ser divulgada. A idéia é denegrir a imagem do sistema de saúde público para convencer as pessoas de que o sistema privado é melhor, sem qualquer discussão sobre assunto.
Se você é usuário de algum plano privado deve estar se perguntando: o que eu tenho a ver com isso e por que defender o SUS? Pois bem, se você fez essa opção deve ser por que o sistema público ainda não funciona como deveria e porque tem condições financeiras para tanto. No entanto, certamente, você não deve estar satisfeito com a idéia de pagar impostos para não receber serviços de saúde em troca e, paralelamente, pagar altas mensalidades para ter um plano que, ainda por cima, tem várias limitações e impõe inúmeras dificuldades, deixando muito a desejar. É uma grande ilusão pensar que os planos de saúde privados que atendem apenas uma pequena parcela da população brasileira prestam serviços de qualidade. Além de custarem os olhos da cara, muitas vezes negam atendimento quando o cidadão mais precisa: deixam de fora diversas cirurgias, medicamentos, exames de alta complexidade e dificultam o atendimento a pessoas idosas, pacientes crônicos e portadores de patologias e deficiências.
O SUS está cotidianamente em nossas vidas e, muitas vezes, sequer nos damos conta disso. Diferentemente dos planos de saúde, ele oferece muito mais do que o acesso apenas aos serviços de saúde diretos, como consultas e exames. Só para se ter uma idéia, ele é responsável por toda a execução das ações de vigilância epidemiológica e sanitária, bem como as de saúde do trabalhador. Na prática, apenas para citar alguns exemplos, os programas de combate à dengue, as vacinações que já erradicaram doenças como varíola e poliomielite além de controlarem a tuberculose, o tétano e sarampo, também são ações do SUS. Além disso, compete à ele a execução das ações de vigilância sanitária de fiscalização e inspeção de alimentos, bebidas e água para consumo humano, controle de sangue e hemoderivados, registro de medicamentos, entre tantas outras ações. Isso tudo também é o SUS, você sabia?
Como você pode ver, o SUS está bem mais próximo de você do que parece. Mas a população brasileira que vem sofrendo um massacre de desinformação pela mídia, ainda não se conscientizou de que o SUS representa a maior política de inclusão social e distribuição de renda do país. A freqüente exposição das mazelas do sistema de saúde que é feita sob a lógica burguesa que inferioriza tudo o que é público de modo absolutamente parcial e alienado para justificar a superioridade aparente do privado faz com que o SUS seja identificado apenas com aquilo que lhe falta. É por isso que se faz necessário que reafirmemos sempre suas conquistas. É preciso que rompamos com essa lógica para conseguirmos efetivar, na prática, aquilo que em muito já avançamos no campo legal, a fim de que possamos garantir que, de fato, a saúde seja um direito de todos e um dever do Estado.
*Flávio Cardoso Arcângelis é membro do Diretório Acadêmico de
Medicina da UNIVASF (DAMUNI) e acadêmico do 6º período do
curso de medicina.